sexta-feira, 18 de julho de 2008

Quando parti uma perna, todas as pessoas que assistiram, aproximaram-se para ajudar e acompanhar o caso. Levaram-me ao hospital, e lá fui visto pelo médico especialista, o ortopedista, que tratou de avaliar a necessidade de gesso, descanso por um período de um tempo e a toma de certos medicamentos devidamente prescritos. Foi-me dada baixa médica e tive uns dias de férias forçadas… Recebi visitas, desejos de melhoras, histórias simpáticas de comparação com outras experiências até mais graves. Tudo para me fazer sentir melhor, para me mostrar como, afinal, no meio do meu azar, até tive muita sorte! E claro, já se sabe, se eu precisasse de qualquer coisinha é só dizer, que temos de ser uns prós outros, hoje és tu e não se sabe se amanhã sou eu…
Quando me partiste o coração, as pessoas fingiram que não viram, por embaraço seu ou por julgarem que seria a mim que me dariam o embaraço. Todos quiseram saber coisas sobre o caso, como foi e como não foi, como acabou e para que lado cada um de nós seguiu, foi a notícia das coscuvilhices da semana, ou até do mês… Mas tudo à distância, sem ousarem falar na minha presença. Não me levaram ao hospital. Porém, ainda assim, recebi uns convites de comiseração para ir ao cinema e jantar fora, para não estar a pensar sempre no mesmo e espairecer a cabeça. Não fui visto pelo cardiologista, mas algumas pessoas fizeram o possível para não me deixarem muito sozinho… Falaram comigo sobre o que viesse à baila, e algumas vezes não conseguiram evitar que um olhar de pena aparecesse timidamente. Fizeram-me a avaliação da situação: que eu precisava de arranjar um passatempo que me ocupasse as horas vagas, que, depois, com o tempo, esqueceria e até encontraria alguém que me merecesse, que se fosse preciso tomaria uns comprimidozinhos para a depressão. Não tive baixa e não pude meter férias, embora a vontade para trabalhar não existisse e a cabeça estivesse a milhas dali. Não recebi desejos de melhoras… Não me contaram como acabou com o Romeu e a Julieta, para me fazerem ver que podia ser pior… Não me disseram para avisar se eu precisasse… Aliás, depois da segunda semana, acho até que me tornei um peso a evitar por todos. Parece que virei um chato! Parece que tinha lepra…
Da perna, nunca corri risco de vida, nem tive prognóstico reservado, mas toda a gente apareceu do nada mostrando-se preocupada e atenciosa. Afinal, foi coisa séria!
De ti, apeteceu-me morrer, mas não tive ninguém que me compreendesse… Afinal, sofria de um achaque, caprichos do coração!
Por uma perna, o mundo mostrou-se presente e solícito. Ao ponto de incomodar…
Pelo meu coração, o mundo se fez ausente e distraído. Ao ponto de magoar…