terça-feira, 15 de abril de 2008

“Não te esqueças de mim!”
Com estas palavras, ela se despediu de nós. Desse nós que éramos enquanto éramos juntos.
É curioso como as pessoas se preocupam em ter quem as guarde na memória… Como se isso valesse por uma vida! Tive um amigo de escola que expressava o seu desejo de, quando morresse, ter muita gente a comparecer ao seu funeral, primeiro enchendo a igreja na missa de corpo presente e, depois, inundando o cemitério numa mancha de negro. É certo que de nada lhe valeria tal acontecimento, nem sequer, sendo ele o defunto a enterrar, pela natureza das coisas, poderia testemunhar essa expressão de luto por si, mas nem assim abdicava desse desejo íntimo. Como se, presentemente, lhe trouxesse paz imaginar esse futuro que nunca chegaria a ver… Ou encontrasse uma aprovação ou até validação para a sua vida no respeito demonstrado por um ambicionado banho de multidão. À procura de um significado para a sua existência na recordação que façam de si.
E assim me pediste, num sumiço de voz que mais parecia implorar, que não te esquecesse, como se procurasses dizer mais do que dizias, tentando abrir-me os olhos para um segredo agora comum… Não te esqueças de mim e eu viverei sempre em ti! Não te esqueças de mim e eu serei sempre tua nessa lembrança! Não te esqueças de mim como sinal de que uma parte de ti me amará para sempre! Não te esqueças de mim, não te esqueças de mim, não te esqueças de mim… Quantos sentidos por desvendar nesse eco da tua aflição? Quantos segredos? Apenas posso confiar que te entendi, que te descobri no que não chegaste a dizer.
Pergunto-me como reagirias se soubesses… Já são poucas as vezes que ainda consigo mentalmente visualizar bem o teu rosto. Vai-se escondendo por detrás de uma nuvem que te leva de mim apesar do meu esforço por te manter. Desculpa! Desculpa por não estar à altura, por te desiludir… por te deixar morrer! Porque é assim que o sinto. Uma traição involuntária imposta pela natureza humana para salvaguardar a sanidade. É que o tempo é um adversário de monta contra o qual não sei como lutar e não tenho como vencer. Ele leva-me a clarividência da tua face, do teu sorriso. Sei que está por aqui, algures em mim, na minha memória, no meu coração, a nitidez de ti que procuro, que protejo, mas já só são sombras o que encontro e vejo.
Recordo o que posso… o que me deixo! Percebo que até as minhas recordações já não são fiéis. São lembranças das lembranças límpidas que já tive. Já são só reminiscências. Como era mesmo esse teu jeito, esse movimento de cabeça com o qual puxavas o cabelo para trás? Como era mesmo o sorriso que me davas quando os teus olhos procuravam os meus à espera de encontrar a minha alma? Como era mesmo o teu olhar que se deixava viver no meu, partilhando confidências na timidez de um silêncio?
Eu sei que sei como era… Já só não sei encontrar-te em mim.