quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Amar, por vezes, é assunto complicado. Mas ainda mais o é, em certas ocasiões, o deixar de amar…
Quando se ama alguém, não se ama só essa pessoa, quem quer que ela seja, mas também se aprende a amar o próprio amor que se sente. Esse sentimento, no seu início ainda mal definido, que surge sem ser convidado e que nos toma por refúgio, escondendo-se em nosso seio, procurando o calor da nossa intimidade secreta, crescendo e transformando-se com o tempo, usando a nossa timidez e recato até poder erguer-se por si mesmo, até o sentirmos forte em comunhão com cada batida do nosso coração, chega a ganhar por face os contornos de um filho que por fim reconhecemos e que, mais do que ser nosso, faz de nós parte. Um sentimento que vem trazer uma cor nova ao mundo à nossa volta, que é capaz de colocar um sorriso – algo idiota, mas inexplicavelmente incontrolável – em nossos lábios, que vem preencher uma parte de nós desertificada! Uma flor, cuja semente não se sabe bem como foi em nós plantada, que fez do coração solo fértil para germinar, frágil e hesitante, sem defesas senão o apelo à nossa própria compaixão, mas que cresceu até florir e desabrochar, espalhando por nosso mundo clandestino um cheiro de intensidade, de vida, de primavera… Como não amar este amor?... Esse amor que nos impele a deixarmos o egoísmo para trás, a oferecer o melhor de nós mesmos a outra pessoa, que nos motiva a nos melhorar e a acreditar que somos capazes de ser melhores, não por nossa própria força e arte, mas por esse alguém que nos anima de forma tantas vezes imperceptível…
Quando se ama, tem-se, assim, dois amores: tanto a pessoa que se ama, bem como o amor que se sente.
Tem, no entanto, um problema este outro amor: é um amor derivado! Ele só existe, porque amamos alguém… Ora, nem sempre se ama a pessoa a certa! Nem sempre se ama quem nos valoriza e reconhece! Nem sempre se ama quem nos ama de volta! Nem sempre se ama quem saiba bem amar! Pelo que, não raras vezes, chega o momento em que não mais podemos fugir à voz da razão que em nós se manifesta e avisa para seguirmos por outro caminho… Pode resistir-se-lhe, evidentemente. Até porque, de início, o amor nos parece ter preso a essa outra pessoa de uma forma inelutável. Com o tempo, porém, podemos perceber que, se calhar, já não é o amor que nos prende, mas somos nós que nos prendemos a ele… Deixar de amar custa, porque não estamos só a abrir mão de alguém, mas porque, principalmente e simultaneamente, sentimos que estamos a abdicar de uma parte de nós que tanto acalentamos! A tal flor, o tal filho…
É difícil aprender a largar algo que tivemos por tão querido e tão precioso para nós! Que nos preenchia tão intensamente, e que, agora, parece deixar um buraco sem fundo, como se, ao arrancarmos aquela flor, tivéssemos acabado por arrancar, inadvertidamente, o nosso próprio coração… Mais ainda, quando, em certas circunstâncias, podemos ter a pessoa que tanto amámos, mas que tanto nos desiludiu, magoou ou desrespeitou, a implorar-nos por uma nova oportunidade, a jurar-nos que tudo será diferente! Pois que, no lugar do amor que nos fazia dar o nosso melhor ao mundo, parece apenas restar agora um coração endurecido, que é capaz de ser tão aparentemente cruel para quem algo nos suplica… São dúvidas, são escrúpulos, são fantasmas, o que nos parece atacar, pôr em sobressalto e fazer reféns.
É preciso ter coragem para largar desse amor. É preciso ter força! Porque, em certas pessoas, chega mesmo a ser-lhes perceptível que, ao largarem dele, estão a sentenciar à morte uma parte de si mesmas. E, ainda mais, quando no tumulto de tão fortes sentimentos, se confunde que essa parte de que se está a largar e a deixar morrer é o que de melhor existe em nós. Porque não é assim! O melhor de nós fica sempre connosco: a capacidade de amar. Quando somos capazes de amar, somos capazes de renascer!
Por isso, não tenhamos medo de fazer os nossos lutos, por muito que eles nos custem e por muito que nos roubem um pouco da nossa esperança. Desistir de um amor e seguir em frente não significa, necessariamente, a vitória do egoísmo, da crueldade ou da indiferença em nós, mas, antes, pode significar a vitória da nossa própria dignidade pessoal. É que não basta amar! É preciso saber bem amar…

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