terça-feira, 2 de dezembro de 2008

“Não quero sofrer mais!”
Não é raro encontrar este eco a ressoar no interior de nós… Sofrer não magoa e fere somente, também cansa! Cansa acreditar para, depois, só encontrar desilusão. E confunde! Porque nos culpabilizamos de nos termos permitido sonhar… Mais vale não pensar. Mais vale fugir de expectativas renovadas que se anunciem ao virar da esquina. Ou então boicotá-las desde o seu berço, maltratando e afastando quem se atreva a tentar reanimá-las. Como um porto que não permite a entrada de nenhum navio, mantendo-os ao largo, com medo de que algum, de entre eles, só esteja interessado em o saquear…
Se, ao invés, me mantiver quieto e sossegado… Se abandonar qualquer aspiração e desistir de tentar… Se for discreto… Quem sabe? Talvez que o tempo vá passando, a vida se vá levando, e o próprio sofrimento desista de mim!
E, então, os anos sucedem-se. Uns atrás dos outros, e nós atrás deles, protegidos pela nossa escolha de comodidade. Sem perceber que o caminho que tomámos nos vai levar a uma encruzilhada de três possibilidades: ou vivemos sempre fugindo, inclusive da nossa própria sombra, enganando o nosso coração e distraindo o nosso espírito, temendo até mais a vida do que a morte; ou, havendo um momento em que não consigamos fugir mais, nos vamos confrontar com o que existe em nós, para o bem e para o mal, descobrindo-o da capa de indiferença em que o tínhamos soterrado e escondido. Neste último caso, ou reencontramos o tal sofrimento de que tínhamos fugido, agora ainda mais amargo e azedo, estragado pela passagem do tempo que o torna intragável, ou não o encontramos de todo, o que, de início, pode ser consolador, mas, mais tarde, se torna pesado, porque se chega à conclusão que até o sofrimento já não quer nada connosco, como se já não fossemos nem merecedores da sua atenção… Três possibilidades! Fugir até à morte, inebriando-nos (ou melhor, porque se deve ser cru!), embebedando-nos com o que tivermos à mão… Não conseguindo fugir para sempre, chegar a um ponto em que ou percebemos que fugimos em vão, perdemos o nosso tempo, porque a dor continua lá e ainda mais forte, ou percebemos que alcançamos o que desejávamos, a indiferença, a descrença, que, por si só, fazem dessa nossa vitória algo bem amargo… (talvez que fosse melhor não termos razão!)
O problema do porto, que mantém os navios ao largo para não correr o risco de ser saqueado, é permitir que o seu medo o impeça de cumprir o fim para o qual foi criado: precisamente, receber navios! Ao não fazê-lo, ele trai-se a si mesmo. Assim também, um ser vivente foi feito para viver, com todos os seus riscos, e não para ser um morto-vivo… Fui eu feito para me esconder do mundo ou para viver no mundo? É certo que viver deixa marcas, e algumas bem dolorosas, mas deixar de viver na totalidade por medo delas é dar-lhes mais importância, é reconhecer-lhes mais valor do que à nossa vida! É acreditar erroneamente que a dor é maior do que nós, e que justifica que nos anulemos em face dela, em vez de perceber a verdade que reside em sermos bem maiores do que ela! O que não devemos fazer é trair a vida que existe em nós, mas, antes, fazermo-nos seus condutores de modo a que ela possa fluir por nós para chegar a alguém mais…

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